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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Os tesouros esquecidos do Palácio do Planalto

Autor(es): Isabel Clemente
Época - 07/02/2011

Uma valiosa coleção de quadros, móveis e esculturas foi encontrada abandonada em armários, depósitos e garagens da sede da Presidência

Quando a reforma do Palácio do Planalto ficou pronta, há cinco meses, uma comissão interna de especialistas saiu à procura das obras de arte espalhadas pela sede e pelos quatro anexos da Presidência. O objetivo era reunir o que de melhor havia para decorar os amplos corredores e salões vazios da sede do poder. Era um pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, incomodado com os quadros trancados em gabinetes, longe dos visitantes.

O que Lula não sabia, nem a comissão desconfiava, era da existência de uma valiosa coleção de quadros, esculturas e móveis abandonados em armários, depósitos e garagens. Dois quadros do pintor espanhol Joan Miró, avaliados em US$ 1,5 milhão cada um, apareceram assim. Um saiu de um depósito de suprimentos. O outro estava na parede de uma salinha ocupada por uma funcionária. Parecia tão improvável que foi preciso verificar a autenticidade da assinatura para ter certeza sobre o tesouro escondido.

Na garagem do Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente, foi encontrada uma tela do pintor e arquiteto Firmino Saldanha feita para a inauguração do Palácio do Planalto, em 1960. Da mesma forma, a obra Os músicos, de Glênio Bianchetti, pintor, ilustrador e tapeceiro gaúcho, voltou a formar o quinteto original depois que o quinto quadro foi encontrado num dos anexos da Presidência. Durante muito tempo, os quadros com quatro dos cinco “músicos” serviram de encosto para seguranças num corredor.

A garimpagem também encontrou três exemplares, de 5 x 5 metros, de tapetes Casa Caiada. São artigos feitos à mão, exportados para o mundo todo, que estavam empoeirados em um depósito. Móveis de jacarandá (madeira nobre ameaçada de extinção) dos nomes mais expressivos do design brasileiro estavam na mesma situação. Vendidas em Nova York na casa dos milhares de dólares, cadeiras, mesas e poltronas anos 60 de Sergio Rodrigues, Jorge Zalszupin e Oscar Niemeyer mais pareciam artigos imprestáveis, empilhados no depósito.

Ao recuperar os móveis, a intenção da comissão de curadoria era recobrar o clima da inauguração do Palácio. Como muitos móveis originais tinham sido doados ao longo dos anos, a comissão não encontrou, porém, peças suficientes para decorar todo o Palácio. Foi preciso encomendar novas peças a Sergio Rodrigues, que ainda fabrica suas criações anos 60, e vasculhar depósitos do Congresso Nacional. No Senado, foram encontradas cadeiras e mesas prestes a ser leiloadas por uma bagatela. O diretor de Documentação Histórica do Planalto, Cláudio Soares Rocha, foi pessoalmente pedir ao presidente do Congresso, José Sarney, que suspendesse a oferta pública. Saiu de lá com 400 exemplares para restauração. Agora, os ministros que despacham no Planalto usam genuínas mesas de jacarandá assinadas por Zalszupin, cotadas a US$ 29 mil a unidade (R$ 48.400)

Telas, esculturas e tapetes reunidos e recuperados passaram a compor uma inédita exposição permanente nas áreas comuns do Palácio. O corredor que leva ao gabinete da presidenta da República virou uma colorida vitrine de artistas contemporâneos de primeira linha. As telas “estrangeiras” ganharam um ambiente à parte, porque a ideia era valorizar a arte nacional. “Resgatamos a brasilidade deste Palácio. Além do mais, uma obra de arte não pode servir para o deleite de uma pessoa só. Todos têm de ver”, diz o diretor Cláudio Rocha.

O acervo do Planalto cresceu tanto que um dos desafios da Presidência agora é readaptar as visitas abertas ao público, aos domingos, para incluir a história das obras de arte. Parte desse enredo, no entanto, seguirá como um mistério. Como os presentes recebidos pelos presidentes durante o exercício do mandato são levados por eles, ninguém sabe até agora como os quadros de Miró chegaram ao Planalto. O Instituto Manabu Mabe suspeita que a tela do pintor nipo-brasileiro exposta na sala de audiências da Presidência tenha sido um presente do próprio pintor (morto em 1997) ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Algumas obras nacionais importantes, como quadros de Djanira e Di Cavalcanti, vieram da massa falida do antigo estaleiro Lloyds, nos anos 90. Mas outras também têm origem desconhecida. É o caso de A Pietá, de Mário Mendonça, artista brasileiro de arte sacra moderna, que agora está no gabinete da presidenta Dilma Rousseff, a pedido dela. A Pietá, que antes enfeitava uma saleta de um funcionário, se juntou a duas telas da pintora e desenhista Djanira. Empolgada com a recuperação do acervo cultural do Planalto, Dilma expôs a assessores a vontade de ver a capital com exposições itinerantes, usando acervos de outros órgãos federais. É até possível imaginar que esse desejo se transforme no embrião de novas garimpagens nas diversas outras repartições do poder em Brasília. Não será surpresa se outros tesouros forem descobertos.

FIRMINO SALDANHA - Painel Palácio do Planalto, 1960
MIRÓ - (sem título), 1957 - (sem título), 1955
MANABU MABE - (sem título)
NORBERTO NICOLA - (sem título)
SERGIO RODRIGUES - Poltrona Beto, 1960
SERGIO RODRIGUES - Espelhoem jacarandá, 1960

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